Licenciamento Ambiental no Brasil: Guia Completo
Você já se perguntou como o Brasil lida com a proteção do meio ambiente diante do avanço da indústria, da agricultura e da urbanização? A resposta está em um dos instrumentos mais importantes da gestão ambiental: o licenciamento ambiental. Neste artigo completo, você vai entender o que é o licenciamento ambiental, como ele funciona, quais são os instrumentos e fases envolvidas, quais leis regulam o processo e, principalmente, o que acontece quando ele não é respeitado. Vamos começar!
AMBIENTAL
5/7/20259 min read


O que é Licenciamento Ambiental?
Licenciamento ambiental é o processo administrativo pelo qual o poder público autoriza e controla atividades que utilizam recursos naturais ou que possam causar algum tipo de impacto ambiental. O objetivo é garantir que esses empreendimentos sejam planejados e executados com responsabilidade ecológica, prevenindo danos ao meio ambiente.
A licença ambiental, por sua vez, é o documento formal que atesta a autorização. Ela traz as condições, restrições e medidas que o empreendedor precisa cumprir para operar legalmente.
Exemplos de atividades que exigem licenciamento:
Construção de hidrelétricas, portos e estradas
Instalação de indústrias químicas ou metalúrgicas
Exploração de mineração
Criação de gado em larga escala
Extração de madeira
Plantio extensivo com uso de defensivos agrícolas
Essas atividades não só usam intensivamente os recursos naturais, mas também têm potencial de causar desequilíbrio nos ecossistemas. Por isso, o licenciamento ambiental é obrigatório em muitos casos.
A Legislação Ambiental e os Órgãos Competentes
Constituição Federal (Art. 225)
A base legal do licenciamento começa na Constituição de 1988, que afirma que "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado" e que "o poder público e a coletividade têm o dever de defendê-lo e preservá-lo".
Ela também determina que atividades potencialmente causadoras de degradação significativa ao meio ambiente devem ser precedidas de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA).
Lei nº 6.938/1981 – Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA)
Essa lei estabelece os instrumentos da política ambiental no Brasil. Entre eles:
Licenciamento ambiental
Zoneamento ecológico-econômico
Educação ambiental
Avaliação de impacto ambiental
Ela também cria o Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama), composto por órgãos como:
Ibama (nível federal)
Órgãos estaduais e municipais
Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente)
Lei nº 9.605/1998 – Lei de Crimes Ambientais
Essa lei trata das penalidades por infrações ambientais, incluindo:
Multas
Embargos
Prisão
Reparação de danos
Ela responsabiliza tanto pessoas físicas quanto jurídicas, inclusive os gestores, sócios e representantes legais das empresas.
Novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012)
Esse marco legal atualiza as regras sobre APPs (Áreas de Preservação Permanente) e Reservas Legais, além de instituir o Cadastro Ambiental Rural (CAR).
Instrumentos de Avaliação Ambiental: AIA, EIA e RIMA
AIA – Análise de Impacto Ambiental
A AIA é o processo técnico de análise dos possíveis impactos que um empreendimento pode gerar. Ela é feita com base nos documentos técnicos (como EIA e RIMA) apresentados pelo empreendedor e visa subsidiar a decisão do órgão ambiental.
EIA – Estudo de Impacto Ambiental
É o principal documento técnico. Realizado por uma equipe multidisciplinar (engenheiros, biólogos, sociólogos, geólogos etc.), o EIA:
Avalia os impactos positivos e negativos do projeto
Analisa alternativas tecnológicas e locacionais
Sugere medidas mitigadoras
Propõe programas de monitoramento
Ele é obrigatório para atividades listadas na Resolução Conama nº 01/1986.
RIMA – Relatório de Impacto Ambiental
É o resumo técnico do EIA, escrito em linguagem acessível, com gráficos, mapas e quadros. Seu objetivo é informar a sociedade e subsidiar audiências públicas.
Importante: os custos do EIA/RIMA são pagos pelo empreendedor, mas os profissionais devem ser independentes e sem vínculo direto com a empresa proponente.
Grandes empresas listadas na bolsa de valores, por estarem com capital aberto para novos acionistas, possuem extensos e detalhados relatórios de impacto ambiental disponíveis para o público a exemplo de Prio, CSN Mineração, Vale, dentre outras. Vale a pena conferir, pois traz bons ensaios de como podemos realizar o RIMA para a empresa.
As Fases do Licenciamento Ambiental
O licenciamento ambiental no Brasil é dividido em três fases principais. Cada fase tem objetivos distintos, exigências legais específicas e condicionantes técnicas. Compreender bem essas etapas é essencial para qualquer empreendedor, gestor público ou profissional da área ambiental.
Vamos ver, com detalhes, como cada fase funciona.
1. Licença Prévia (LP)
Quando ocorre:
A Licença Prévia é a primeira etapa do processo de licenciamento e ocorre ainda durante o planejamento do empreendimento ou da atividade.
O que ela avalia:
A LP tem como função avaliar a viabilidade ambiental do projeto, considerando a localização proposta, os recursos naturais que serão utilizados, os possíveis impactos positivos e negativos ao meio ambiente e à sociedade, e o equilíbrio entre o custo ambiental e os benefícios sociais e econômicos esperados.
Como funciona na prática:
Para solicitar a LP, o empreendedor deve apresentar ao órgão ambiental um conjunto de informações sobre:
A natureza da atividade (industrial, agropecuária, extrativa etc.);
O porte do empreendimento;
A estimativa da produção e da geração de resíduos e poluentes;
A área exata onde será implementado o projeto;
Quais recursos naturais serão explorados (água, solo, vegetação etc.);
Estudos ambientais prévios, como o EIA/RIMA, se for o caso.
O que o órgão ambiental faz:
O órgão avalia as informações e, se considerar que o projeto é viável do ponto de vista ambiental, emite a LP. Essa licença:
Não autoriza ainda a instalação do projeto;
Estabelece exigências, condicionantes e critérios técnicos que deverão ser atendidos nas próximas fases;
Pode sugerir alterações no projeto original para mitigar impactos.
Exemplos de exigências na LP:
Criação de lagoas de decantação;
Instalação futura de filtros, ETAs ou ETEs (estações de tratamento de água e esgoto);
Adoção de técnicas de manejo florestal;
Mudança de local de instalação para evitar áreas de proteção permanente.
Importante:
Se o projeto não for considerado ambientalmente viável, o órgão ambiental nega a LP, encerrando o processo de licenciamento.
2. Licença de Instalação (LI)
Quando ocorre:
Após a emissão da LP e o cumprimento de todas as exigências estabelecidas nela, o empreendedor entra com o pedido da Licença de Instalação (LI).
O que ela autoriza:
A LI autoriza a execução das obras, a instalação de estruturas físicas, a aquisição de equipamentos e, em geral, toda a infraestrutura necessária para a implementação do empreendimento.
O que deve ser apresentado:
Para obter a LI, o empreendedor deve:
Apresentar o projeto executivo da obra/atividade;
Demonstrar que todas as condicionantes da LP foram cumpridas;
Apresentar novos estudos técnicos exigidos, se houver.
O que o órgão ambiental analisa:
Nesta fase, o órgão verifica se:
O projeto está de acordo com a LP;
As medidas de controle ambiental estão contempladas no planejamento;
O empreendimento não oferece riscos adicionais ao meio ambiente além dos previstos anteriormente.
Resultado:
Se tudo estiver conforme o exigido, a LI é concedida. Caso contrário, o órgão pode suspender o processo ou solicitar complementações.
Importante: A execução das obras sem a LI é considerada irregular e pode acarretar multas, embargos e até responsabilização penal.
3. Licença de Operação (LO)
Quando ocorre:
A Licença de Operação é a fase final do licenciamento ambiental. Ela é solicitada após a conclusão das obras e da instalação dos equipamentos, mas antes do início das atividades do empreendimento.
O que ela autoriza:
A LO autoriza o funcionamento efetivo da atividade — ou seja, o início da produção, operação, comercialização ou prestação de serviços, conforme o projeto licenciado.
Requisitos para obtenção:
Para obter a LO, o empreendedor precisa comprovar:
Que todas as condicionantes da LP e da LI foram integralmente atendidas;
Que os sistemas de controle ambiental (filtros, tratamento de resíduos, áreas de preservação) estão instalados e funcionando;
Que foram feitos os monitoramentos ambientais obrigatórios;
Que o projeto final corresponde ao que foi autorizado na LI.
O que o órgão ambiental faz:
O órgão realiza vistorias técnicas e análise documental. Se tudo estiver conforme, a LO é concedida.
Validade e renovação:
A LO tem prazo de validade determinado e deve ser renovada periodicamente. A renovação deve ser solicitada com pelo menos 120 dias de antecedência do vencimento, conforme a Resolução Conama nº 237/1997 e a Lei Complementar nº 140/2011.
Pontos de Atenção sobre as Fases
As licenças são interdependentes: não é possível obter a LI sem antes ter a LP, nem iniciar a operação sem a LO.
A licença não é do empreendedor, mas do empreendimento: uma licença para um posto de gasolina, por exemplo, não autoriza automaticamente a instalação de uma oficina ou restaurante no mesmo local.
Cada atividade precisa estar expressamente prevista na licença: se forem várias atividades (como venda de combustível, lavagem, troca de óleo), todas devem ser analisadas e autorizadas.
É responsabilidade exclusiva do empreendedor arcar com os custos, riscos e prazos do processo de licenciamento.
Competência dos Órgãos Ambientais
Uma das grandes dúvidas de quem precisa obter uma licença ambiental é: qual órgão ambiental é responsável por concedê-la? A resposta depende de onde e como os impactos do empreendimento ou atividade se manifestam.
No Brasil, o licenciamento ambiental é um instrumento descentralizado. Isso significa que a competência para conduzir o processo e emitir as licenças pode ser da União (governo federal), dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios. Essa estrutura segue o princípio da repartição de competências, previsto na Constituição Federal.
Quando a competência é federal?
O órgão responsável em nível federal é o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). O Ibama é acionado nos casos em que o empreendimento gera impacto ambiental de abrangência nacional ou interestadual, ou seja, quando ultrapassa os limites de um estado ou envolve mais de uma unidade da federação.
Além disso, o Ibama é responsável quando o empreendimento:
Está localizado em áreas de fronteira;
Afeta terras indígenas ou unidades de conservação federais (como parques nacionais);
Envolve atividades nucleares ou radioativas;
Está situado no mar territorial ou na plataforma continental;
Está vinculado a bases militares ou possui função de segurança nacional.
Se um projeto nessas condições for licenciado por outro órgão (estadual ou municipal), a licença será considerada nula, e tanto o empreendedor quanto o órgão que a emitiu podem ser responsabilizados por eventuais danos ao meio ambiente ou a terceiros.
Quando a competência é estadual?
Os órgãos estaduais de meio ambiente (geralmente vinculados a secretarias de meio ambiente dos estados ou ao IEF, IEMA, SEMACE, entre outros nomes locais) são responsáveis por licenciar empreendimentos cujos impactos ambientais se restringem ao território de um único estado.
Além disso, cabe aos estados o licenciamento de atividades localizadas em unidades de conservação estaduais e também de empreendimentos que afetem dois ou mais municípios dentro do mesmo estado. Os estados também podem licenciar atividades por delegação da União, conforme previsto em lei.
Em certos casos, mesmo sendo o licenciamento de competência estadual, o órgão estadual precisa consultar o órgão federal (Ibama) ou os órgãos municipais, especialmente quando há sobreposição de áreas protegidas ou conflitos de interesse.
Quando a competência é municipal?
O licenciamento ambiental pode ser feito pelo município quando os impactos da atividade ou empreendimento são estritamente locais – ou seja, não ultrapassam os limites territoriais do município. Nesse cenário, o órgão ambiental municipal (geralmente a Secretaria de Meio Ambiente local) tem autonomia para conduzir todo o processo.
Além disso, os estados podem delegar aos municípios a competência para licenciar outras atividades, desde que os municípios tenham estrutura técnica e legal para assumir essa responsabilidade.
Contudo, nem todos os municípios estão capacitados para isso. E mesmo que estejam, há limites: por exemplo, se a supressão de vegetação nativa ultrapassar 1.000 hectares em área rural, a autorização será de competência do Ibama, mesmo que toda a área esteja dentro de um único município, conforme a Resolução Conama nº 378/2006.
Conflitos de competência e cooperação
É importante destacar que, em empreendimentos de maior porte, é comum a cooperação entre os entes federativos. Um exemplo é o licenciamento de grandes obras que atravessam municípios e estados, como rodovias, linhas de transmissão e gasodutos. Nesses casos, mesmo que o Ibama conduza o licenciamento, os órgãos estaduais e municipais devem ser consultados.
Essa articulação visa garantir que os impactos sejam analisados em todas as escalas possíveis e que as exigências legais sejam respeitadas nos diferentes níveis de governo. Caso não haja esse alinhamento, o licenciamento pode ser questionado judicialmente e até anulado.
Quem é o Responsável?
A responsabilidade pela obtenção das licenças e pela realização dos estudos ambientais é exclusiva do empreendedor. Isso inclui:
Contratação de consultorias
Pagamento de taxas
Elaboração de relatórios técnicos
Participação em audiências públicas
O empreendedor também deve acompanhar a renovação das licenças, geralmente a cada 4 ou 5 anos, para garantir a continuidade da atividade legalmente.
Riscos pelo Descumprimento da Legislação Ambiental
Risco de Crédito
Instituições financeiras podem perder o retorno do investimento se o empreendimento for embargado por falta de licença.
Risco de Reputação
Um banco ou empresa que financia ou executa atividades ilegais pode ter sua imagem severamente afetada perante a opinião pública.
Risco de Responsabilidade Civil
Mesmo sem culpa ou dolo, o empreendedor (e seus financiadores) podem ser obrigados a reparar os danos causados ao meio ambiente e indenizar terceiros.
Risco de Responsabilidade Penal
Se o dano for intencional ou causado por negligência, pode haver responsabilização penal, incluindo:
Prisão dos responsáveis legais
Suspensão de atividades
Multas diárias
Um exemplo clássico foi o licenciamento das hidrelétricas no Rio Madeira, em Rondônia. O processo foi precedido por intensas audiências públicas e análises paralelas feitas pelo Ministério Público.
Outro caso emblemático é o de bancos que financiaram empresas sem licença ambiental. Mesmo sem envolvimento direto na operação, essas instituições foram responsabilizadas por omissão.
O licenciamento ambiental não é um obstáculo ao desenvolvimento, mas sim uma garantia de que esse desenvolvimento será sustentável. Ele protege:
A natureza
As comunidades locais
A economia a longo prazo
Os próprios empreendedores, ao evitar multas e embargos
Respeitar esse processo é sinal de responsabilidade ambiental, legal e social.